Escritos na varanda

Imagino-me a escrever na varanda, ao fim da tarde, com o Sol a por-se no horizonte e uma bebida gelada ao lado. Como eu nem sequer tenho varanda, tudo isto é ilusão.

domingo, 31 de julho de 2016

Campos verdes e águas azuis


Talvez porque hoje é domingo, o céu parece mais azul. É possível que nos outros dias também seja azul, mas ninguém repara, ocupados que estão nas suas correrias.
Nos dias de semana as pessoas estão preocupadas com os terroristas, que nos respectivos locais de trabalho lhes aterrorizam a vida, por isso não têm olhos para a cor do céu, apenas vêm os ponteiros do relógio, as filas de trânsito e os horários dos transportes.

Porque hoje é domingo as águas param, as margens dos rios estendem-e até onde a vista alcança, e até os pássaros, que não usam calendário mas pressentem a presença de mais pessoas do que o habitual, estão mais receosos e recatados.

Porque hoje é domingo a natureza abraça os homens de boa vontade.

sábado, 30 de julho de 2016

Bancada de trabalho


Um novo projecto está a nascer. É vital para os trabalhos futuros, já estou farto de fazer "coisas" no chão ou na bancada da cozinha.


Depois dos planos e dos cálculos pego na serra, e de repente e quase por acaso reparo que as madeiras não têm uma largura uniforme. Deveriam ser todas iguais mas não são, as diferenças são de vários milímetros.
Se cortasse tudo a eito, como estava a pensar fazer, porque há cortes que são repetitivos, alguns dos entalhes iriam ficar com folgas acentuadas.


É uma merda este Leroy Merlin. Vende caríssimo e não tem qualidade nenhuma. E para piorar, como não tenho plaina, compro madeira aparelhada que é ainda mais cara.
Quando um dia finalmente arranjar uma plaina, já posso comprar madeira tosca que sempre é um bocado mais barata.

sexta-feira, 29 de julho de 2016

Extinguiu-se o fogo no meu olhar


Quando ninguém liga aos bombeiros é bom sinal, quer dizer que ninguém precisou deles.

quinta-feira, 28 de julho de 2016

A sopinha


Uma bela sopa feita com espinafres da horta.
Aquilo foi só deitar a mão e colher mas agora que penso nisso, nem todas as folhas pareciam de espinafres.
Se efectivamente não eram espinafres... paciência, adeus mundo.

quarta-feira, 27 de julho de 2016

O anão e o gigante


"O anão pegou na motoserra e derrubou a árvore maior que havia na floresta."

Não faltarão moralistas da treta a querer tirar ilações e dar lições a propósito de frases de profundidade questionável como esta,
No entanto se fosse ao contrário, se algum gigante esborrachasse com o pé um anão, os mesmos ou outros moralistas da treta, tirariam outras ilações e tentariam dar novas lições ao mundo.

Ate que um dia eu conheci-a. Era quase da minha altura mas era a maior de todas as que eu encontrara. Ao pé dela eu não era nada e duvido que soubesse da minha existência se eu não a tivesse abordado.
Eu seguia-a com o olhar enquanto se afastava em buscas dos seus sonhos de grandeza.
Eu retirava-me cabisbaixo quando regressava dos seus fracassos.
Por mais de uma vez lhe falei, por igual número de vezes me ignorou.
Um dia partiu e não voltou. Apressei-me a ir fechar a porta, não fosse ela regressar.

segunda-feira, 25 de julho de 2016

domingo, 24 de julho de 2016

O lugar das flores


- Vou dizer-te isto sem gaguejar.
- Sabes, eu... hummm... . E gaguejei.
- Continuas o mesmo mentiroso de sempre.

De que são feitos os sonhos? De algodão? De algodão doce? De algodão doce cor de rosa?
Ou de flores? De todas as cores e feitios? Azuis, brancas ou amarelas? Em vasos, canteiros ou jardins?
Não, são feitos da mais dura realidade.
Eu empurrei-te para a frente, para te fazer avançar mais e mais depressa. Mas tu caiste, atiraste-te para o chão como fazem os jogadores de futebol. E agora a culpa é minha.
Claro que é. Já antes era, porque já anteriormente tinha feito outras tentativas para te fazer ter mais auto confiança, só que todas as minhas metodologias falharam.
Tem de haver um processo. Vou continuar a procurar. Se não conseguir encontrar o fracasso será completo mas será meu.
O lugar das flores não é numa jarra, mas na terra onde possam continuar a crescer.


sábado, 23 de julho de 2016

Uvas


Que venha o vinho, porque dos sóbrios não reza a história.

quarta-feira, 20 de julho de 2016

A falésia


O tempo convidava a não sair de casa, o vento convidava a não sair do carro, a chuva convidava a não por os pés na areia.
Só a vontade indomável de contacto com a natureza nos fez descer a falésia íngreme e afrontar os salpicos das ondas.
Depois subi-la foi mais fácil que a escuridão da noite esconde o medo das vertigens.
Até à próxima, disseram.
Não sei se haverá próxima, digo eu.

terça-feira, 19 de julho de 2016

Até amanhã


... Porque manhã, sabes bem
É sempre longe demais...
(Rádio Macau, Amanhã é sempre longe demais)

Estava quase a ir-se embora mas ainda teve tempo para se virar ligeiramente e apontar-me o dedo, como quem diz "A culpa é tua".
A pausa durou uns breves instantes, talvez aguardando uma resposta minha que não veio, e como tal virou-se e continuou o seu caminho.

segunda-feira, 18 de julho de 2016

Poquemerda


A última réstea de esperança apagou-se. A manipulação de massas afinal é mais fácil e mais efectiva do que eu poderia supor.
Sim, o barco afundou-se já há cem anos, mas a orquestra continua a tocar, cada vez mais desafinada é certo, indiferente ao seu próximo e inexorável fim.


domingo, 17 de julho de 2016

O recanto


Num momento de loucura atravessou-me o pensamento a ideia de a trazer aqui.
Felizmente logo de seguida a lucidez voltou.
Sim, eu não tenho o direito de estragar este recanto com a presença dela. Já me basta ter de a aturar em casa.
O recanto fica só para mim.

sábado, 16 de julho de 2016

O telhado da vizinha


Não confundir com a garagem da vizinha.
Já havia um violino no telhado, agora há também um guarda sol no telhado.

sexta-feira, 15 de julho de 2016

Água mole em pedra dura


Desde há milénios que o loureiro e o telheiro de chapa ondulada se encontram em rota de colisão, tal como a deriva continental.
A erosão causada pelo atrito há-de acabar por cortar o ramo ao loureiro, dentro de aproximadamente 2,5 milénios, segundo os meus cálculos.

quinta-feira, 14 de julho de 2016

Praia das ondas claras


Há uma praia onde as ondas
Vestidas de claro branco
Irrompem na areia a sorrir
Trazendo os cheiros do mar
A espuma desfaz-se em canções
De ouriços e estrelas do mar
E os salpicos são flores
Que atiram ao passar.
Há uma praia com ondas
Perfumadas de marés
Correm na areia, suaves
Vem-te molhar os pés


quarta-feira, 13 de julho de 2016

Passeio a pé


"Lose your memory in a thousand places
Disappearing in a sea of faces,
Always lonely,
I live tho only way I know."
(John Miles / Remember yesterday)

Havia uma pedra do caminho que me acompanhava já há algum tempo. Por causa dela tive que parar. Sentei-me no chão, era o que havia, e descalcei o sapato. Aproveitando a paragem, descalcei também o outro, sacudi-os bem e ali fiquei por uns instantes com a garrafa de água na mão e o boné bem puxado para a frente por causa da intensa claridade. Quando já me começava a doer o rabo por causa daquele chão duro voltei a calçar os sapatos, levantei-me e continuei a caminhada. 

"Por causa dela tive que parar", "Por causa dela tive que parar", "Por causa dela tive que parar". Agora a frase não me saia da cabeça, tal como acontece com aquelas músicas chatas que ouvimos no rádio logo de manhã e passamos o dia a trautear.
Ali no meio de nada que antídoto é que poderia haver para isto? Contar os passos pareceu-me uma boa ideia, mas não resultou, de x em x passos lá vinha a frase à memória. 
Cantar? Talvez, mas em breve a respiração se tornou ofegante porque apesar de ser um simples passeio, o ritmo da caminhada era mais para o alto do que para o baixo. 

Parei de novo. Desta vez não foi por causa dela, foi para tirar da mochila uma caneta e um pedaço de papel. Por causa dela ia sair mais um soneto.


terça-feira, 12 de julho de 2016

Searas ao vento


Era como se ao fundo do vale acabasse esta vida e começasse outra nova. Ficava por saber se era uma vida nova igual a esta ou diferente.
Havia mais vales, mais encostas, mais searas, sabia disso, e sentia-se culpado porque era a esta que se dedicara.
Já há muito tempo que devia ter esquecido, mas o vento que soprava sobre a seara continuava a trazer-lhe memórias de outros vales.

segunda-feira, 11 de julho de 2016

Música para pássaros


Eu bem que tento afugentar os pássaros da minha horta, mas a música que eu lhes dou em vez de os afastar, tem como único efeito atrair o cão, que fica maluco com as sombras e os reflexos.


domingo, 10 de julho de 2016

Mesa de serra tico tico


Eu olho para isto e só me vem à cabeça um desenho do Quino.
Depois de tanto trabalho e de tantas horas o que é que eu faço a isto, ou melhor, o que é que eu faço com isto?

Vários problemas se colocam. O primeiro de todos é o tamanho, não tenho onde colocar isto, só no chão. O segundo e o mais grave é a extraordinãria vibração que o conjunto apresenta quando em funcionamento. Tem que forçosamente ficar preso a alguma coisa, mas onde?

Tem mais um conjunto de imperfeições, que não interferem no funcionamento, globalmente estou bastante satisfeito com o trabalho feito, mas...



Não está ainda acabado, falta levar duas travessas na base para poder ser fixado a alguma coisa. O que significa que a seguir tenho mesmo que fazer uma bancada de trabalho, quanto mais não seja para poder fixar convenientemente esta mesa.

Em relação ao projecto inicial fiz duas alterações. Em primeiro lugar o sistema de fixação da serra na parte de baixo do tampo não funcionou (ficou com folga e não fui capaz de resolver) por isso tive de inventar um outro com parafusos. Em segundo lugar resolvi aumentar a altura da área de corte e para isso tive de inventar um sistema móvel para ajuste dos rolamentos que servem de guia à lâmina.

Algumas fotos das diversas fases de construção.











Para terminar, o link para o video original do prijecto e os meus agradecimentos à Oficina de Casa e ao Marcelo Aguilera
https://www.youtube.com/watch?v=0Tz6q18zC7Q


sexta-feira, 8 de julho de 2016

Requiem por uma horta


De manhã estava tudo bem. A seguir ao almoço fui jogar no euromilhões e quando voltei a horta estava neste estado.
Escusado será dizer que quando encontrei quem fez isto, vai acabar dentro de uma panela.
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quinta-feira, 7 de julho de 2016

Barco à vista


Alguém gritou: "Olha um barco".
Normalmente é ao contrário, dos barcos é que se grita quando avistam terra.
A proa altiva lá estava. Mas era a única coisa. Não tinha mastros nem velas. Nem âncora, chaminés ou escotilhas. Não havia água nem cais. Nem capitão, imediato ou tripulação.
Era um país de marinheiros. Hoje é apenas um país onde outrora havia marinheiros.

quarta-feira, 6 de julho de 2016

A mesa do pequeno almoço


A minha mesa do pequeno almoço não tem toalhas de renda nem canecas de porcelana. A bem dizer nem mesa tem.
Felizmente que para mim a puta da vida não se resume à estúpida obediência a regras de conduta como pensa o mundo de merda de me rodeia.




terça-feira, 5 de julho de 2016

A alface


Quem venha aqui à espera de encontrar relatos de tratamentos milagrosos à base de alface, esqueça, veio ao sítio errado. Aqui fala-se de factos, não de crendices.
Desconfio que não deve haver alimento nenhum que não tenha a sua legião de fãs, apoiados por mensagens difundidas pela internet, do estilo "A cura pelo (alimento x)".
Do amendoim ao tremoço, passando pela batata, o repolho ou o cogumelo, tudo tem uma propriedade, uma vitamina, uma enzima, quiçá até mesmo um mineral que faz bem a quase tudo incluindo unhas encravadas.
Possivelmente a alface também terá as suas propriedades, mas agora que penso nisso reparo que não me recordo de ter visto alguma mensagem sobre a dita planta. É uma falha grave.

O que é que a alface tem de especial para eu vir aqui falar dela? Nada a não ser o facto de ser até agora o único produto que colhi da minha horta. E dois factos extraordinários me chamaram a atenção.

1º facto extraordinário: as alfaces são pequenas. Já colhi umas seis ou sete e em todas elas o tamanho não chega a metade daquelas que se vendem nos mercados. A terra foi estrumada antes, eu deixo-as ficar até umas semanas mais do que o tempo indicado no livro de instruções, mas mesmo assim elas não crescem.

2º facto extraordinário: as alfaces duram muito tempo. Tenho uma alface no frigorífico há perto de duas semanas e está como nova, ainda hoje a comi, enquanto as de compra ao fim de três ou quatro dias servem para ir para o lixo.

A minha salada resume-se a uma folha de alface migada para dentro do prato. Detesto as restantes coisas com que habitualmente estragam as saladas, como cebolas, tomates e outras coisas de que nem sei os nomes. Já para não falar dos molhos e condimentos nojentos dos quais destaco pela negativa o pior de todos, o vinagre.
Daqui se depreende que uma alface para mim poderia durar muito tempo... se durasse. Acontece que não duravam. Eu comprava alfaces enormes das quais consumia meia dúzia de folhas e deitava fora o resto porque se estragavam. Agora com estas "Made in minha horta" como-as até ao fim.

sexta-feira, 1 de julho de 2016

Sozinho na varanda


Ainda se lembrava de caber perfeitamente na varanda. Quando era pequeno a varanda era um espaço imenso onde brincava. Quando corria chegava à outra extremidade já cansado.
Agora, ali sentado ao Sol, se esticasse as pernas, os pés saiam para fora do gradeamento. E bem que precisava de as esticar de vez em quando porque a inactividade prolongada provocava-lhe cãimbras.
Numa dessas vezes, e quando já recolhia os pés para dentro, um movimento mais brusco fez com que um dos chinelos lhe caísse do pé. Felizmente não acertou em ninguém, mas acarretou uma cansativa descida à rua para o apanhar e respectiva subida de novo até ao terceiro andar.
Desde essa altura, sempre que ia para a varanda, ia sozinho, os chinelos ficavam em casa, mesmo que as meias estivessem rotas.