Escritos na varanda

Imagino-me a escrever na varanda, ao fim da tarde, com o Sol a por-se no horizonte e uma bebida gelada ao lado. Como eu nem sequer tenho varanda, tudo isto é ilusão.

terça-feira, 31 de janeiro de 2017

O alho português


Este alho, por mais que se esforce, não consegue falar francês. Cresceram as duas extremidades, cresceram-lhe as folhas, cresceu-lhe a raiz, mas o meio, le milieu, nada. Rien. Pas du tout.
Merde.



segunda-feira, 30 de janeiro de 2017

Passarolândia


Está encontrado o criminoso. Finalmente descobri o porquê de tanta desarrumação.
O melro, esse pássaro idiota que existe por aqui às dúzias, todos os dias mete o bico na tijela do cão.
O resultado é a comida espalhada em redor.

domingo, 29 de janeiro de 2017

Alfaçário


Alfaçário, como o próprio nome indica, é um berçário para alfaces.
A primeira foto foi tirada no dia 21 de Janeiro, data em que as sementes foram lançadas à terra, perdão, ao algodão.


As duas fotos seguintes foram tiradas a 29 de Janeiro.
Oito dias depois da primeira estava na altura de mudar a fralda e transferi-las para algo mais consistente.


Resta-me agora comer mais iogurtes e mousses de chocolate para arranjar amais embalagens vazias para as restantes.
Tenho que pensar também num processo alternativo ao algodão, porque as raizes, mesmo minúsculas prendem-se nos fios do algodão e ao puxar, as plantinhas partem-se com facilidade.
Da próxima vez vou experimentar colocar as sementes directamente na terra.


quinta-feira, 26 de janeiro de 2017

Ponte sem destino


Passa-se a ponte e chega-se a um território onde só há salpicos das ondas, vento e gaivotas.
É o local ideal para te dizer coisas que não queres ouvir, porque não consegues ouvir: a força do vento é superior à convicção da minha voz.
Depois, porque não há mais nada para dizer, porque o vento agreste corta a pele, porque a espuma das ondas molha-nos a cara como lágrimas que não conseguem sair, atravessamos novamente e ponte, desta vez em sentido contrário, a caminho de nada.


segunda-feira, 23 de janeiro de 2017

Sopa de penca


A auto-suficiência a nivel das couves está no bom caminho. Já vou ter sopa para o jantar de hoje.
E na horta, de onde vieram estas folhas, ainda lá ficaram muitas para muitas mais sopas.


domingo, 22 de janeiro de 2017

Filosofia de jardim


Pensei em desembaraçar a mangueira, mas depois ocorreu-me que seria perder tempo. A água não se importa com isso, segue sempre em frente e acaba por sair pelo sítio correcto.

sábado, 21 de janeiro de 2017

Limoeiro


Já não fazem caroços de limão como antigamente. Depois de ter tentado plantar milhares deles durante os últimos quatro ou cinco anos, desisti.
Bom, milhares é um exagero, não foram assim tantos foram só cinco. Cinco de cada vez que utilizava limões. A maior parte deles não davam nada, os poucos que cresciam um bocadinho aguentavam-se algumas semanas e acabavam por secar.
Farto de tanto insucesso, fui à Cooperativa de Sintra e comprei um pé de limoeiro já crescido. Já o tenho há uma semana, estava à espera da minha ajudanta, mas ela não veio, por isso tive de fazer o trabalho sozinho.
Pronto já está. A geração a seguir à minha já deve ter limões para apanhar. Para que isso aconteça vou fazer uns sacrifícios ao deus dos trovões e ao deus das chuvas para que a árvore cresça bem.
Depois deste trabalho todo vou começar por sacrificar uma carcaça com queijo.




quinta-feira, 19 de janeiro de 2017

Psicologia do frio


O frio é psicológico, só pode. Está frio mas nada de extraordinário ou invulgar.
Já suportei temperaturas mais baixas, já pratiquei atletismo com temperaturas negativas, e nunca tive tanto frio como agora.
Ou então é da idade, sei lá.

quarta-feira, 18 de janeiro de 2017

Caminho para outro lado


... Sigo um trilho que não vejo
Um caminho que não sei
Ando por montes e vales
Salto pedras, cruzo valas
Corro ruas e avenidas
Becos de fraca memória
Guia-me a Estrela Polar
E a trajectória do Sol
Sigo em busca do infinito
Procuro a Natureza
Sem relógio nem ponteiros
Nem setas obrigatórias
O que fizer amanhã
Depende de onde for hoje...



terça-feira, 17 de janeiro de 2017

À sombra da beira mar


Descemos os dois as escadas que conduzem ao vasto areal, e caminhámos lentamente pela beira mar. Desceste a escada da ponta norte e eu a do lado sul. O mar estava calmo e a maré baixa transmite uma sensação de segurança que é um convite a caminhar pela água. Sentei-me na areia, tirei os sapatos e fiquei por instantes a ver o Sol cruzar a linha do horizonte. Depois levantei-me e continuei o caminho, desta vez com os pés enterrados na espuma das ondas que, vagarosas, davam à costa.
As sombras da noite começavam a acentuar-se e tive dificuldade em distinguir-lhe as feições quando nos cruzámos, Os cabelos compridos e escuros que a brisa teimosamente empurrava para a cara apenas deixaram ver um nariz arrebitado.
Disse "boa noite" quando passou por mim, ao que eu respondi na mesma moeda. e antes que levantasse o pé para dar o passo seguinte, a voz voltou a dirigir-se a mim, desta vez em tom de pergunta: António?
Parei, virei-me e dei de caras com uma cara com ar tão surpreendido como o meu. O meu cérebro trabalhava a toda a velocidade e buscando recordações nos confins longinquos da memória consegui associar a imagem vaga que tinha à minha frente ao tom de voz que me interpelou e apenas consegui dizer "Vanda".
Ao ouvir o nome o tom de surpresa desapareceu e fez um sorriso, como se se tivesse desvanecido o receio de que não a recordasse ou reconhecesse.
O sorriso no entanto foi breve. Aproximou-se e cumprimentou-me. Logo de seguida deu uns passos atrás e sentou-se onde a areia não estava ainda molhada pelas ondas. Sentei-me também, mantendo alguma distância.
Com os olhos postos na ténue claridade que indicava onde estava a linha do horizonte, disse: "Reconheci-te pela voz".
- Eu não, lamentei cabisbaixo.

segunda-feira, 16 de janeiro de 2017

O regato


As sombras do fim da tarde
Abatem-se já sobre o vale
Das águas quase paradas
Sobe um canto a Primavera
Descalço, molho os pés
Refresco o pensamento.
Sento-me naquela pedra
Ouvindo a água a correr
Parei eu, parou o tempo
E as águas quase pararam
Até a brisa da serra
Com o cheiro a rosmaninho
Parou o sopro vadio
Fazendo até que os pássaros
Os mosquitos e as abelhas
Parassem o seu voar
Num breve instante tão longo
Que parecia a eternidade
Fez-se ouvir o silêncio
A calma da Natureza.
Depois veio nova batida
Do coração apressado
E a vida voltou à vida.


domingo, 15 de janeiro de 2017

A cascata dos desejos


- Porque é que me trouxeste aqui? gritou ela.
- Porque é que estás a gritar? perguntou ele.
- O quê? gritou ela.
- Porque é que estás a gritar? respondeu ele desta vez aos gritos.
- Tu é que estás a gritar, respondeu ela.
- Tu gritaste primeiro, responde ele.
- Não se ouve nada com o barulho, gritou ela.
- Eu ouço, não precisas de gritar, respondeu ele.
- Vamos embora, disse ela.
- Não ouço nada, respondeu ele.
- Vamos embora, berrou ela.
- Ok, não sou surdo, respondeu ele.
Afastaram-se. À medida que caminhavam o som ia diminuindo até quase deixar de se ouvir. Iam os dois em silêncio, cada um com os seus pensamentos.
Ela tentou agarrá-lo e ele tentou esquivar-se.
Tal como diz a canção, não se ama alguém que não aprecia a mesma cascata.

sábado, 14 de janeiro de 2017

Memórias de uma praia deserta


Levar as feridas a passear à praia tem um efeito dolorosamente benéfico. O contacto com a água do mar arde, e muito, mas depois saram mais depressa.
O tratamento não é subsidiado. Não há nenhum médico que o receite nem nenhum sistema de saúde que o comparticipe.
As farmácias também não vendem frasquinhos com água do mar.

Ali estava uma toalha. E por cima tinha um corpo a apanhar banhos de Sol. Um corpo que falava e ria, e beijava e abraçava. Depois deu-se a erosão, e a praia ficou vazia. Primeiro foram umas ondas pequeninas, que a pouco e pouco foram crescendo. Por fim uma maré imensa de desprezo e raiva veio das profundezas do oceano e levou tudo à sua frente, incluindo o corpo sobre a toalha. Nem uma mensagem de despedida ficou escrita na areia. Nada.
Hoje trouxe as minhas feridas até à praia. Ardeu muito, Por pouco até que a água do mar não me lavava as memórias também.
A erosão muda quase tudo. Mudou a praia, Mudou-me a mim. Só as feridas permanecem. Mas agora, com o tratamento estão a caminho de ficar curadas mais rapidamente.

sexta-feira, 13 de janeiro de 2017

Fumo


Para quem não sabe, o fumo pode ser artístico. Permite tirar fotos muitos boas. O problema, cof, cof, cof, cof, são as vias respiratórias.
E pensar eu que ainda ontem a chaminé foi limpa.
Em vez de fazerem milho transgénico, os cientistas deviam era inventar lenha transgénica que não fizesse fumo.
O que eu precisava mesmo era de um tratado moderno de como acender a lareira neste apartamento (*).



(*) Como sabem (não sabem???), trata-se de uma piada de mau gosto, como são todas as inventadas por mim, relativa ao livro "Tratado moderno de como acender lareiras em apartamentos" de João J. A. Madeira.

quinta-feira, 12 de janeiro de 2017

Trabalhos em madeira - anéis


Uma incursão na joalharia. Desta vez o que saiu da fábrica foram anéis, sem rubi que o preço das pedras preciosas está pela hora da morte.
Ao contrário do que diz o ditado popular, foram-se os dedos e ficaram os anéis.

terça-feira, 10 de janeiro de 2017

À beira mar plantado


O pescador destroçado
Sentou-se em sua cadeira
Com voz de cana rachada,
A sua, agora rachada,
Gritou à fúria dos ventos:
O meu reino por um anzol!
Eu sem cana não sou nada.
Tenho um robalo à espera
Ali, na espuma das ondas
Mais ao largo há uma tainha
E ao longe vejo um sargo.
Volto de balde vazio
Sem nada que por no tacho
Desta vez a caldeirada
É ilusão dos sentidos


segunda-feira, 9 de janeiro de 2017

A ilha


A ilha é quase deserta. Como qualquer deserto que se preze não lhe falta a areia do respectivo banco de areia onde está assente. A única utilidade conhecida é tomar conta do rio, não vá ele desaguar com muita força no mar. Convém salientar que a ilha está situada mesmo na foz, o que faz com que não seja uma ilha do rio nem uma ilha do mar. É apenas um monte de cascalho capaz de estragar algum navio que vá por ali mais distraido.
Além de tomar conta do rio, dá emprego a um farol. Tem ainda na sua superfície um forte, tão fraquinho, tão fraquinho, que nunca nenhum inimigo se deu ao trabalho de o tentar conquistar.
Quando o aquecimento global provocar o degelo dos polos a a água do mar subir, passa o farol a trabalhar subaquáticamente.
Muito útil para um país que gastou tantos milhões em submarinos.

sábado, 7 de janeiro de 2017

O campo


O campo por oposição à cidade.
Como sinónimo de vastidão, em contrapartida aos espaços fechados e claustrofóbicos.
Onde se vê o horizonte e não o telhado do vizinho.

sexta-feira, 6 de janeiro de 2017

Trova da chuva que passa


Quando a chuva batia na janela
Trazia-lhe à memória a imagem dela
Sentado ali, por trás do reposteiro
Via o mundo sumir-se em aguaceiro.
Não tinha muito mais o que fazer
Apenas só sentar-se e ver chover.
Aguardava o fim da tempestade
Para poder sair pela cidade.

quinta-feira, 5 de janeiro de 2017

Trabalhos em madeira


Mais dois trabalhos em madeira. Foram entregues depois do Natal mas não têm nada a ver com o Natal. Eram dois presentes de aniversário que chegaram com cerca de dois meses de atraso.
Sofreram uma derrapagem.



terça-feira, 3 de janeiro de 2017

Sol bi-estrelado


Não bastava o Sol de ontem apontar inúmeros caminhos, hoje temos um Sol a dobrar, a apontar ainda mais caminhos.
Ou então é o Planeta Nibiru, que se esconde atrás do Sol

segunda-feira, 2 de janeiro de 2017

Sol estrelado


Parece o Sol da meia noite mas não é. É das cinco da tarde, fotografado com uma abertura de f/22.
Se eu fosse daqueles que seguem caminhos apontados por estrelas, tinha aqui um grande problema. É que isto aponta para todos os lados, e eu não saberia para onde ir.
Já não fazem estrelas-que-apontam-caminhos como antigamente.

domingo, 1 de janeiro de 2017

O balanço do ano


Poderia pensar-se que antes parado do que a andar para trás, mas a verdade é que andar para trás serve para tomar balanço, passe a redundância, para ir para a frente.
O balanço do ano é como os balanços da vida e como os interruptores, umas vezes para trás, ou para baixo e outras vezes para a frente ou para cima.
Estas oscilações todas não me causam enjoos, felizmente. e delas falarei, como tenho feito, no meu dia a dia de escritor de blog.
Mas há uma coisa que me deixa verdadeiramente frustrado. Foi de longe o ano em que pratiquei mais horas de guitarra, mas continuo sem ver progressos significativos.
Há uns teclados que tocam sozinhos. Se houvesse guitarras assim...