O portão gemeu nos gonzos enferrujados, um
chiar lúgubre que evocava sons de outros tempos e reavivou memórias do passado.
Apoiou-se na enxada para ajudar o corpo
cansado a endireitar-se e lentamente rodou sobre si próprio. Colocando a mão em
pala sobre os olhos para se defender dos raios do sol que já quase beijava o
cume dos montes perdidos na distância do horizonte, tentou distinguir quem se
aproximava. Não esperava ninguém, aliás não esperava nada. Uma silhueta, apenas
uma silhueta escura, enquadrada pela luz brilhante de um por do sol sem nuvens aproximava-se
vagarosamente, como que a medo. À distância de alguns metros parou, embora o
corpo se balanceasse, como que hesitando se deveria aproximar-se mais ou não.
Durante um instante, que pareceu uma eternidade, fez-se ouvir o silêncio, que
abafou por completo o chilrear de fim de tarde dos pássaros nas árvores
próximas. Por fim a silhueta falou.
- Sabia que podia encontrar-te aqui.
- Não me podes encontrar porque não estou
perdido.
- Eu estou.
- Que fizeste ao mapa que te dei?
- Perdi-o.
- Então o mapa é que está perdido, não tu.
Tu sabes onde estás agora.
- Deixas-me entrar?
- Já cá estas dentro.
- Entrei sem pedir licença.
- Não precisas.
O portão voltou a fazer ouvir o seu chiar,
desta vez seguido de um pequeno estrondo. Tinha ficado aberto e o vento
encarregou-se de o fechar.