Um último adeus à janela. Depois o vidro
fechou-se que a noite estava fria. O carro arrancou, primeiro devagar, depois
mais rápido à medida que os quilómetros iam passando. Acelerou, embora não
tivesse pressa, não tinha horas para chegar porque não tinha sítio aonde ir.
Queria estar concentrado na condução, ter algo que lhe ocupasse o cérebro, porque
assim não pensava em mais nada.
Sim, era uma fuga, sabia disso. Sabia que
mais tarde ou mais cedo teria que voltar a enfrentar a realidade, quanto mais
não fosse porque a gasolina acabaria. Mas enquanto pudesse queria fugir aos
pensamentos que vinham atrás de si, que o agarravam pelos ombros e o abanavam,
mostrando-lhe que não tinha futuro porque o presente tinha ficado lá atrás, no
passado.
À medida que as horas iam tomando conta da
noite e o cansaço ia entorpecendo os músculos, a razão foi vencendo a
depressão. Fez meia volta, e iniciou o caminho de regresso. Pelo meio teve
tempo para se recriminar a si próprio por ter deixado as coisas chegarem ao
ponto a que chegaram.
Há muito que devia ter desistido. A
liberdade, a mesma liberdade que reclamava para si, dera-a aos seus pensamentos,
e claro está que pensamentos livres são indomáveis, deixou de ter mãos neles.
Chegou finalmente a casa. Estacionou o
carro, abriu a porta e saiu. Parecia que se sentia mais leve. Era do vazio que
sentia dentro de si.