Escritos na varanda

Imagino-me a escrever na varanda, ao fim da tarde, com o Sol a por-se no horizonte e uma bebida gelada ao lado. Como eu nem sequer tenho varanda, tudo isto é ilusão.

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

O furo


Subiu os degraus dois e dois enquanto a respiração aguentou. Quando a língua se recusou a entrar na boca novamente, passou a subi-los um a um, até ter a sensação de que todo o ar que havia na imensa escadaria não lhe chegava aos pulmões. Nessa altura teve que parar e encostar-se à parede por uns instantes até a respiração acalmar um pouco, o suficiente para lhe permitir voltar a subir a escada, mas desta vez a passo de caracol e com a ajuda das mãos agarrando-se ao corrimão.
Quando finalmente entrou na sala, deixou-se cair pesadamente na cadeira, que só a muito custo conseguiu aguentar com os seus noventa quilos. O barulho que todas as suas juntas fizeram não augura nada de bom para a próxima vez que tal peso lhe voltar a cair em cima. Já muito aguentou ela ao longo dos anos.
Tirou um lenço da algibeira para limpar o suor que lhe escorria pela cara, e enquanto isso olhou rapidamente para o relógio na parede. Sim, estava quase na hora da edição da tarde e estava atrasado.
Pegou numa folha e introduziu-a na máquina. Os dedos começaram a percorrer o teclado com uma agilidade que poderia surpreender quem não o conhecesse e fizesse juízos errados baseando-se apenas na sua figura, ao mesmo tempo que o tec-tec das teclas invadiu a sala.
Quando lesse, o chefe não poderia deixar de o promover, pensou.