Escritos na varanda

Imagino-me a escrever na varanda, ao fim da tarde, com o Sol a por-se no horizonte e uma bebida gelada ao lado. Como eu nem sequer tenho varanda, tudo isto é ilusão.

sexta-feira, 21 de abril de 2017

No reduto das princesas


Abriu a janela e olhou para baixo. É um bocado alto, pensou. Apoiou os cotovelos no parapeito, colocou as mãos debaixo do queixo e ficou pensativa, a olhar o infinito, que visto ali do alto era bué de longe.
Lamentava agora ter mandado cortar a trança. Sempre que fazia birra, era quase todos os dias, esbracejava, gritava, chorava, e acabava por ficar toda despenteada, parecia aqueles cães peludos nos quais não se distingue onde fica a cabeça e onde fica a cauda. Um dia, num acesso de raiva, mandou vir uma cabeleireira e cortou o cabelo.
Agora, sem trança, o príncipe não tinha como subir. Se ele não sobe, desço eu, pensou. Dirigiu-se à cama e desfez tudo em busca dos lençóis, mas com tantas modernices nem lençóis havia, eram só edredons e capas de edredons, o que não dava para nada.
Ainda pensou em pedir as capas às irmãs, de forma a atar várias umas às outras, ma depressa desistiu da ideia. Aquelas betinhas idiotas iriam logo contar aos pais,e já sabia qual seria o castigo.
Seria transferida para um quarto cuja janela dava para o pátio interior e, horror dos horrores, onde chegariam a toda a hora, os sons das liras, das cítaras, dos alaúdes e as vozes esganiçadas das cantoras líricas que permanentemente divertiam a restante família e seus convidados, em festas das quais não se conhecia o início nem se sabia quando terminariam.
Por mais que pensasse não encontrava uma forma de sair dali. Lamentou-se mais uma vez, agora por não saber fazer nada. Se soubesse costurar, por exemplo, fazia um avental e uma touca que lhe cobrisse a cara quase toda e podia assim sair disfarçada de empregada.
Nem o príncipe a poderia ajudar. Por uma daquelas coincidências nas quais o destino é fértil, apaixonara-se pelo mais estúpido de todos os mancebos que conhecia.
Assim, só lhe restava continuar a sonhar com unicórnios, cavalos alados, dragões que cospem fogo, bruxas com caldeirões e sapos verdes.