Ia a meio da escada, ofegante. A inclinação
não era muita, o peso da mala que carregava e cujas rodas estavam partidas é
que dificultava o seu avanço.
De repente a porta abriu-se e ela apareceu,
puxando também por uma mala. Pareceu ficar surpreendida por o ver chegar ou
talvez ficasse surpreendida por ele a ver a partir. Deu um jeito no casaco e no
cabelo, deitou a mão à porta como se a fosse fechar, mas retirou-a ao fim de
uns segundos de hesitação, virando-se então para a frente e aguardando que ele
acabasse de subir o que faltava da escada.
A surpresa era mútua. Também ele estava
surpreendido por a ver sair da casa de hóspedes com uma mala, como se fosse
partir. Ia partir, de facto, embora tivesse acabado de chegar. À última hora
mudou de opinião.
Chegado ao último degrau inclinou-se para a
frente para a cumprimentar com um beijo mas ela recuou. Desculpou-se de olhos
postos no chão, sem o encarar de frente, dizendo que não podia ficar, tinha
sido um erro, tudo desde o início tinha sido um erro. Contornou a mala dele que
atravancava o caminho e começou a descer a escada.
Ainda ergueu um braço, com a mão aberta e
os dedos estendidos e trémulos como se a quisesse agarrar, ao mesmo tempo que da
boca entreaberta começou a sair um nome, mas depressa baixou o braço e fechou a
boca. Não valia a pena.
Ficou a vê-la afastar-se até desaparecer no
fim do caminho, depois pegou na mala, entrou na hospedaria e após as
formalidades foi para o quarto que tinha marcado.
Da janela não se via grande coisa, apenas
os telhados das outras casas, uma parte da muralha da vila e o céu azul com
algumas nuvens. O único movimento eram os pardais e os pombos que por ali
esvoaçavam e ficou ali a vê-los.
Vendedor de cafés de profissão, fazia esta
zona há vários anos. Tinha-a conhecido há alguns meses na vizinha cidade das
Caldas, era empregada de um estabelecimento seu cliente. Tinham combinado
passar o primeiro fim de semana juntos.
Afinal tudo não passara de um erro. Sim,
ela tinha razão, como geralmente as mulheres têm, tudo desde o princípio tinha
sido um erro. Ele é que ainda acreditava que as coisas eram o que pareciam ser.