Escritos na varanda

Imagino-me a escrever na varanda, ao fim da tarde, com o Sol a por-se no horizonte e uma bebida gelada ao lado. Como eu nem sequer tenho varanda, tudo isto é ilusão.

quarta-feira, 3 de setembro de 2014

Talvez te espere


Olhou mais uma vez para o relógio, um pouco a medo, temendo que os ponteiros, por via da pilha nova que colocara na véspera tivessem desatado a corre atrás um do outro cheios de energia e chegassem primeiro que ele à hora marcada.
Mas não, verificou suspirando de alívio, ainda faltavam vários minutos para a hora marcada e os ponteiros moviam-se com a mesma lentidão de sempre. Moviam-se à velocidade de sessenta eternidades por hora. Cada minuto que esperava por ela parecia-lhe uma eternidade.
À hora marcada, chegou ao local marcado. Ao local marcado por si, onde resolvera esperá-la, desde que resolvera esperá-la. O banco de jardim lá estava à sua espera. Era a única coisa que o esperava.
Sentou-se e esperou.
À hora habitual ela apareceu ao fundo do caminho, caminhando em passos cadenciados e seguros, passos de quem sabe para onde vai.
À medida que se ia aproximando a sua figura ia aumentando de tamanho, deixando de ser uma figura minúscula do tamanho de uma formiga, até atingir a altura da mulher que conhecera dez anos antes no momento em que passava em frente do banco onde estava sentado, diminuindo depois de tamanho à medida que se afastava pelo lado oposto.
Tal como todos os dias, seguia-a com o olhar, desde que aparecia, pelo seu lado direito, até que desaparecia ao fundo do caminho pela sua esquerda.
Tal como todos os dias, o olhar dela mantinha-se sempre fixo em algum lugar, no infinito, à sua frente.
Só então, depois de ela desaparecer de vista se levanta, virava à esquerda também e iniciava o caminho de regresso a casa.
Mas neste dia aconteceu algo de diferente. Quando passava em frente do banco onde estava sentado, parou, deus dois passos como que coxeando na direcção do banco de jardim e sentou-se na outra extremidade. Baixou-se, tirou um sapato, virou-o ao contrário e sacudiu-o fazendo sair uma pedra que lá tinha entrado. Calçou-o novamente, levantou-se e continuou o seu caminho de todos os dias.
Ao fim de alguns minutos, que pareceram eternidades, desapareceu por fim na última curva do caminho.
Levantou-se então, virou também à esquerda e antes de começar o caminho de regresso pensou “talvez te espere amanhã”.