Escritos na varanda

Imagino-me a escrever na varanda, ao fim da tarde, com o Sol a por-se no horizonte e uma bebida gelada ao lado. Como eu nem sequer tenho varanda, tudo isto é ilusão.

segunda-feira, 12 de fevereiro de 2018

A construção



As portas fecham-se
E as janelas abrem-se.
No entanto as paredes continuam a suportar o peso do telhado.

Foi pregando até chegar a uma parte da tábua onde, devido aos nós, a madeira era mais rija. Os pregos não entravam facilmente, então foi necessário aplicar mais força. Puro engano.
Devia saber, ou lembrar-se, que não se martela com mais força, a cabeça de um prego junto à qual está a cabeça de um dedo. O resultado pode ser…

Tinha agora tempo para pensar. A quantidade de pessoas que já estavam à espera na sala de espera, quando chegou, não deixava margem para optimismo.

Talvez que o problema fosse dos sonhos. Mas não, não podia ser, não acreditava nisso. A verdade é que nos últimos tempos tinha sonhado várias vezes com martelos. E agora, zás, acontecia-lhe um azar com um martelo.
Não podia ser, repetia para si próprio. Tantas vezes que sonhara em ganhar o euromilhões, e até agora nada, continuava a pregar pregos na vida.

A vida, a sua, era uma sucessão de sonhos pegados. E não só de noite, de dia, sobretudo de dia, também sonhava, e nada lhe acontecia, nem só um se tinha tornado realidade.
Portanto, a relação entre sonhar com martelos e dar uma martelada num dedo só podia ser coincidência.

Ah, as coincidências. Tantas que já lhe tinham acontecido. Como a martelada por exemplo. Se tivesse tirado o dedo um instante antes nada disto lhe teria acontecido.

Chamaram agora mais uma pessoa. A vida, ali dentro daquelas paredes, corria devagar. Tinha tempo para pensar nas muitas tábuas que tinha para pregar, nas muitas construções que tinha para erguer, nas muitas coincidências que tinha para enfrentar.
Custasse o que custasse, o telhado não podia desabar.