Escritos na varanda

Imagino-me a escrever na varanda, ao fim da tarde, com o Sol a por-se no horizonte e uma bebida gelada ao lado. Como eu nem sequer tenho varanda, tudo isto é ilusão.

terça-feira, 17 de janeiro de 2017

À sombra da beira mar


Descemos os dois as escadas que conduzem ao vasto areal, e caminhámos lentamente pela beira mar. Desceste a escada da ponta norte e eu a do lado sul. O mar estava calmo e a maré baixa transmite uma sensação de segurança que é um convite a caminhar pela água. Sentei-me na areia, tirei os sapatos e fiquei por instantes a ver o Sol cruzar a linha do horizonte. Depois levantei-me e continuei o caminho, desta vez com os pés enterrados na espuma das ondas que, vagarosas, davam à costa.
As sombras da noite começavam a acentuar-se e tive dificuldade em distinguir-lhe as feições quando nos cruzámos, Os cabelos compridos e escuros que a brisa teimosamente empurrava para a cara apenas deixaram ver um nariz arrebitado.
Disse "boa noite" quando passou por mim, ao que eu respondi na mesma moeda. e antes que levantasse o pé para dar o passo seguinte, a voz voltou a dirigir-se a mim, desta vez em tom de pergunta: António?
Parei, virei-me e dei de caras com uma cara com ar tão surpreendido como o meu. O meu cérebro trabalhava a toda a velocidade e buscando recordações nos confins longinquos da memória consegui associar a imagem vaga que tinha à minha frente ao tom de voz que me interpelou e apenas consegui dizer "Vanda".
Ao ouvir o nome o tom de surpresa desapareceu e fez um sorriso, como se se tivesse desvanecido o receio de que não a recordasse ou reconhecesse.
O sorriso no entanto foi breve. Aproximou-se e cumprimentou-me. Logo de seguida deu uns passos atrás e sentou-se onde a areia não estava ainda molhada pelas ondas. Sentei-me também, mantendo alguma distância.
Com os olhos postos na ténue claridade que indicava onde estava a linha do horizonte, disse: "Reconheci-te pela voz".
- Eu não, lamentei cabisbaixo.