Escritos na varanda

Imagino-me a escrever na varanda, ao fim da tarde, com o Sol a por-se no horizonte e uma bebida gelada ao lado. Como eu nem sequer tenho varanda, tudo isto é ilusão.

quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

O portão

                                    Mem Martins, 2 Fevereiro 2014

O portão gemeu nos gonzos enferrujados, um chiar lúgubre que evocava sons de outros tempos e reavivou memórias do passado.
Apoiou-se na enxada para ajudar o corpo cansado a endireitar-se e lentamente rodou sobre si próprio. Colocando a mão em pala sobre os olhos para se defender dos raios do sol que já quase beijava o cume dos montes perdidos na distância do horizonte, tentou distinguir quem se aproximava. Não esperava ninguém, aliás não esperava nada. Uma silhueta, apenas uma silhueta escura, enquadrada pela luz brilhante de um por do sol sem nuvens aproximava-se vagarosamente, como que a medo. À distância de alguns metros parou, embora o corpo se balanceasse, como que hesitando se deveria aproximar-se mais ou não. Durante um instante, que pareceu uma eternidade, fez-se ouvir o silêncio, que abafou por completo o chilrear de fim de tarde dos pássaros nas árvores próximas. Por fim a silhueta falou.
- Sabia que podia encontrar-te aqui.
- Não me podes encontrar porque não estou perdido.
- Eu estou.
- Que fizeste ao mapa que te dei?
- Perdi-o.
- Então o mapa é que está perdido, não tu. Tu sabes onde estás agora.
- Deixas-me entrar?
- Já cá estas dentro.
- Entrei sem pedir licença.
- Não precisas.

O portão voltou a fazer ouvir o seu chiar, desta vez seguido de um pequeno estrondo. Tinha ficado aberto e o vento encarregou-se de o fechar.